Brincando com a comida
- Felipe F. Freitas
- Jan 23, 2013
- 2 min read
Sentado e, até então, distraído com meu almoço em um pequeno restaurante próximo ao consultório, sou convidado a participar de uma sucessão de fatos em uma mesa logo adiante. Vindo dela, escuto um sonoro "chega!". E antes mesmo dos meus olhos encontrarem o emissor, recebo a confirmação da mensagem, com sua repetição em um tom mais baixo, mas que mantinha a firmeza da palavra. Na mesa, uma até então, suposta mãe segura e sacode repetidas vezes uma das mãos de uma criança de aproximadamente uns 6 anos (seu suposto filho), fazendo-o largar alguns palitos que caiam sobre seu prato.
Ao observar aquela mulher, seu gestual e fisionomia, enxergo com o auxílio da minha doce miopia, um dragão corpulento que perdera a habilidade para cuspir fogo, mas que mantinha a combustão interna, não conseguindo evitar a fumaça por suas narinas enquanto despejava seu sermão materno durante a mastigação de sua última garfada ou de sua última presa. No meio do "você não para quieto", "a hora de comer não é a de brincar", escuto pela primeira vez a voz do infante em tom afirmativo: "Mãe, mas eu gosto é de brincar!". E pegando uma batata-frita com uma das mãos, consegue habilmente prender as suas extremidades em um palito, completando verbalmente: "Olha, D de Daniel. O meu nome". E um imediato riso surge – em mim também, mas escondido por meus lábios passa despercebido – desses travessos que atravessam os dentes que permanecem fechados, devorando, posteriormente, a sua criação.
A mãe, abalada pela resposta, mas não se dando por vencida, solta um inapropriado e destruidor "quero ver quando você tiver filhos". E, imediatamente dando de ombros, o menino responde de forma simples, como se aquela mulher falara a maior bobagem de todo o globo terrestre: “ué, vou continuar brincando", passando um palito para sua mãe como um convite para a brincadeira, mas fazendo apenas com que a adulta da relação o pousasse na mesa e encerrasse o assunto.
E eu, de forma silenciosa, espero que ele continue brincando por muitos ou todos os seus anos. E me faço lembrar que uma semana antes convidava o filho de uma amiga a construir castelos com saches de açúcar em uma cafeteria.
As crianças são lúdicas e se expressam através desta mesma ludicidade. Pena que nós adultos entendamos pouco do universo infantil, já que os anos transformam a nossa criança em vagas lembranças presentes apenas nas fotografias amareladas distribuídas em álbuns guardados por nossos pais.
Ps: em um mês de janeiro, onde a maioria dos meus clientes mirins estão de férias, sinto um aperto de saudade.













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